Início » Hackeando ciências sociais em contexto de dataficação: entrevista com Simon Lindgren Interviews Hackeando ciências sociais em contexto de dataficação: entrevista com Simon Lindgren Lindgren fala de seu novo livro Data Theory Simon Lindgren, professor de sociologia da Umeå University, na Suécia, lançou recentemente o livro Data Theory, em que procura aproximar os métodos computacionais e a sociologia. Ele também é autor dos livros Digital Media and Society e New Noise. Entre seus artigos, um dos destaques aborda como hackear as ciências sociais em contexto de dataficação. Em Data Theory, Lindgren argumenta em favor de uma perspectiva híbrida entre dados e teoria social para dar sentido às questões políticas e midiáticas contemporâneas. Para ele, é necessária uma ciência de dados crítica, de maneira que teorias e métodos precisam ser desmontados e remontandos de maneiras experimentais. DIGILABOUR: Afinal, o que significa exatamente hackear as ciências sociais em contexto de dataficação? SIMON LINDGREN: No livro Data Theory, eu brinco com a ideia de “hackear as ciências sociais” como algo que precisamos fazer na era da dataficação. Hackear é uma boa metáfora por vários motivos, e não necessariamente a ver com computadores e dados. Hackear é uma forma de destruição, pois os hackers quebram os sistemas. Em relação à histórica divisão entre pesquisa qualitativa e quantitativa, ela até pode ter funcionando quando tínhamos, de um lado, etnografias, e, de outro, surveys e estatísticas, do outro. Mas atualmente há, definitivamente, uma necessidade de derrubar o sistema atual e colocar essas coisas juntas novamente de novas maneiras. O cenário de dados de hoje é radicalmente diferente. Eles podem ser não estruturados, ou em grande escala e numérico, mas também em rede, como, potencialmente, tudo junto. Portanto, no livro, quero encorajar os pesquisadores a serem criativos ao juntar novas abordagens teóricas e metodológicas, quebrando as convenções acadêmicas vigentes sobre o que pode e não pode ser feito em termos de combinar diferentes partes de métodos e diferentes partes de teorias de formas incomuns. Hackear, mais uma vez, também é sobre ser inteligente e explorar dados e teorias, jogando os pontos fracos e fortes dos sistemas estabelecidos a seu favor. Devemos fazer o que funciona em vez de sermos dogmáticos. DIGILABOUR: Você enfatiza a necessidade de dados precisarem de teoria e a teoria precisar de dados. Mas isso não é algo novo. LINDGREN: O principal argumento, realmente, é que você não pode ter um sem o outro. Acredito que muitas pesquisas boas estão sendo feitas atualmente neste sentido. Precisamos de big data e small data, e precisamos de interpretação, bem como também de computação. Cada método deve ter permissão para fazer o que faz de melhor. Mas, o que eu queria mais explorar com o livro é o que acontece se olharmos para o lado interpretativo e “qualitativo” das ciências sociais como a interface para a ciência de dados e a computação, em vez de focar somente no lado estatístico e “quantitativo”. Até mesmo podemos conceber a ciência de dados como uma forma de etnografia. DIGILABOUR: Como, então, pensar a ciência de dados como etnografia? LINDGREN: O objetivo da etnografia é fornecer uma “descrição densa”, como escreveu Geertz, do contexto social em análise. Além disso, a etnografia depende de dados ricos e não estruturados, além do pesquisador estar inserido em seu objeto empírico de estudo. Acredito que o que os cientistas de dados fazem é semelhante, pois isso também depende de dados “que ocorrem naturalmente” e não são estruturados, mas, sim, ricos e confusos. Como pesquisadores, também estamos inseridos no contexto dataficado que estudamos – com seus fluxos, plataformas e lógicas. Fornecer uma descrição densa da vida social no mundo de hoje pode significar que nos baseamos de forma seletiva e inteligente em métodos que não têm sido convencionalmente associados ao paradigma etnográfico. Assim, pesquisar de forma exploratória um modelo vetorial do Reddit pode ser enquadrado como um empreendimento etnográfico, para citar apenas um exemplo.DIGILABOUR: Você está iniciando uma nova pesquisa sobre algoritmos e resistência. O que pode nos dizer sobre ela? LINDGREN: O nome do projeto é, obviamente, inspirado na noção de algoritmos da opressão, de Safiya Noble. As tecnologias e plataformas definitivamente têm ideologias, poder e opressões. Mas, neste projeto específico, queremos olhar também o outro lado, colocando a questão de como os ativistas podem utilizar-se das possibilidades das plataformas e lógicas algorítmicas para combater o racismo. Estaremos observando, por exemplo, quaisquer consequências positivas da dataficação para o antirracismo. Isso implicará estudar doxing e sousveillance, por exemplo. DigiLabour Compartilhar Artigo AnteriorDesmercantilizar as plataformas: entrevista com Ursula Huws Próximo ArtigoTecnoutopias racializadas e coloniais em relação ao futuro do trabalho: entrevista com Kalindi Vora 18 de outubro de 2020