Você já leu o livro Cooperativismo de Plataforma, do Trebor Scholz, e gostaria de mais indicações de leitura sobre o tema? Confira essas dicas DigiLabour.
AMPLIAÇÃO DO CONCEITO DE COOPERATIVISMO DE PLATAFORMA
O grupo Dimmons, da Universitat Oberta de Catalunya, tem realizado investigações sistemáticas sobre plataformas cooperativas e relações de plataformas com os objetivos de desenvolvimento sustentável. Autoras como Mayo Fuster, Melissa Renau e Ricard Espelt abordam seis dimensões: dados, tecnologia, modelo econômico, governança, impacto e responsabilidade social. Entre as características, estão data commons, governança democrática, diversidade de gênero, arquitetura e infraestruturas de dados, intercooperação e economia justa e circular.
Entre os textos, recomendamos Sustainable platform economy: Connections with the sustainable development goals, A framework to assess the sustainability of platform economy: the case of Barcelona ecosystem e Data for Sustainable Platform Economy: Connections between Platform Models and Sustainable Development Goals. Tem também artigo sobre metodologias de cocriação aplicado a políticas públicas no caso da economia de plataformas. Já fizemos live sobre o tema com Melissa Renau e em breve anunciaremos projeto conjunto DigiLabour-Dimmons.
Você já ouviu falar nas DisCO? É a sigla para Distributed Cooperative Organisation, um modelo organizacional que combina ideias e práticas do cooperativismo, do comum, do movimento P2P e da economia feminista. O movimento nasceu da Guerilla Media Translation e seu objetivo é prototipar novas formas de propriedade, governança e empreendedorismo com base nos princípios acima de forma a combater as desigualdades econômicas considerando o potencial tecnológico, mas sem cair em algo tecnocêntrico.
Eles lançaram um relatório super instrutivo – e, aliás, muito descolado – sobre os seus princípios, elementos e exemplos – os DisCO Labs, seus projetos-piloto. Os princípios envolvem o valor social e ambiental das iniciativas, governança democrática a todo mundo que é afetado pelas cadeias de valor da iniciativa, criação ativa de bens comuns, produção balanceada entre o local e o global – com recursos compartilhados e atenção coletiva ao trabalho de cuidados (care work is the core). As DisCO buscam reimaginar origens e fluxos de valor a partir de valores de mercado (para sobrevivência dos trabalhadores), criação de bens comuns, e trabalho de cuidados. Em breve o relatório será traduzido para o português.
PRINCÍPIOS E DIMENSÕES
Em relação à governança e às políticas públicas, indicamos artigos de Nathan Schneider, Tech New Deal: Policies for Community-Owned Platforms e Governable spaces: a feminist architecture forplatform policy. Além disso, o autor compartilhou recentemente um repositório vasto de referências sobre o tema, incluindo o papel de governos locais em apoio a cooperativas. Ele também já foi entrevistado pelo DigiLabour.
Outro ponto importante para o cooperativismo de plataforma é o design. Embora não seja diretamente relacionado ao tema, o livro Design Justice, de Sasha Costanza-Chock pode ajudar a pensar o papel do design das plataformas – e suas políticas – na construção de cooperativas. Outro livro nesta mesma direção é Políticas do Design, de Ruben Pater.
Além disso, os princípios de trabalho decente em plataformas, conforme o projeto Fairwork, são cruciais para a construção de cooperativas, levando em conta questões de remuneração, condições de trabalho, contratos, gestão e representação. Em artigo para o Nexo Políticas Públicas, Rafael Grohmann e Mark Graham apresentam os princípios.
Outra dimensão central para o cooperativismo de plataforma são as políticas de dados. No livro Smart City Citizenship, Igor Calzada posiciona o papel dos regimes de dados na construção de cooperativas de plataforma em um contexto de luta por outras cidades inteligentes. Em um artigo, ele também detalha a importância de cooperativas de dados como um subtipo de plataformas cooperativas. Para Calzada, cooperativas de dados são um subtipo de cooperativas de plataforma, em que estas se concentram em modelos de negócios, enquanto as cooperativas de dados compartilham e armazenam dados. Ele também já esteve presente no DigiLabour.
Ursula Huws, em Reinventing the Welfare State: digital platforms and public policies, defende uma construção generalizada de plataformas locais – dos mais diferentes tipos, públicas, cooperativas – para enfrentar a plataformização do trabalho dominante, enquanto redesenho de circuitos locais de produção e consumo direcionado por políticas públicas. Huws já esteve presente no DigiLabour em entrevista e conferência – onde alertou para o risco de as plataformas cooperativas ficarem confinadas a guetos hipsters.
Além dela, outros autores já apontaram limites e contradições do cooperativismo de plataforma, como Callum Cant (tanto no livro Riding for Deliveroo quanto no artigo Operaismo Digital) e Rafael Grohmann. Mas um dos textos que se debruça de forma mais profunda nessas questões é o de Marisol Sandoval, Entrepreneurial activism? Platform cooperativism between subversion and co-optation. Embora ela acredite nos potenciais das cooperativas como alternativa, em entrevista ao DigiLabour, também afirma: “nem sempre fica claro o que cooperativas de plataforma, de fato, são, tanto em teoria quanto na prática. O que conta para ser uma cooperativa de plataforma? Quais as fronteiras?”
ALGUNS EXEMPLOS
As cooperativas nas áreas de comunicação, cultura e tecnologia podem ajudar a pensar relações com o cooperativismo de plataforma. Sharing Like We Mean It e Co-operative Alternative and the Creative Industries são dois relatórios de pesquisa sobre o setor. As investigações apontam que mais da metade das cooperativas utiliza-se de tecnologias open source, e apenas um terço usa serviços de outras cooperativas. A maioria dos trabalhadores se diz satisfeita em geral com as condições de trabalho e afirma que os pagamentos são iguais ou maiores às médias praticadas pelo setor. A investigação aponta para um ecossistema pequeno, mas vibrante, de uma diversidade de organizações nas áreas de cinema, agências de publicidade, estúdios de cerâmica e espaços de coworking, entre outros. Eles dizem que o maior bem de uma cooperativa é a tomada de decisão de forma democrática. As iniciativas se descrevem como mais igualitárias em relação a idade e gênero e com desigualdades persistentes em relação à raça.
Outro exemplo muito utilizado quando se fala em cooperativismo de plataforma é a Stocksy. Juliet Schor e Samantha Eddy fizeram uma análise sobre a iniciativa, presente no artigo The Just and Democratic Platform? Possibilities of platform cooperativism. Elas argumentam que os custos tecnológicos estão diminuindo, possibilitando a criação de plataformas com código aberto. Contudo, ressaltam que a capacidade das cooperativas moldarem amplamente o mercado de trabalho é limitada, mesmo com uma maior colaboração intersetorial entre cooperativas. Isso significa que o cooperativismo de plataforma pode ser apenas mais um elemento na reestruturação do sistema em prol de uma economia digital mais justa. Assim, as autoras defendem reapropriações locais e regionais de plataformas, em seus mais diferentes níveis.
Em breve, a revista South Atlantic Quarterly publicará um dossiê sobre plataformização e seus descontentes. Entre os artigos, haverá uma pesquisa sobre cooperativas e coletivos de entregadores em países da Europa e da América do Sul.
O Institute for the Cooperative Digital Economy, dirigido por Trebor Scholz, já publicou relatórios resultantes das pesquisas de seus fellows no ano de 2020. Destacamos Platform Worker Organizing, de Min Sun Ji, Collecting Dignity: Recyclables Waste Pickers of Brazil, de Luciana Bruno, e The Politics of Platform Cooperativism, de Jonas Pentzien.
QUER SABER MAIS?
Nesta terça, às 14h, o Platform Cooperativism Consortium e o RadFest recebem Noam Chomsky para conversar com os cofundadores da Drivers Cooperative, cooperativa de motoristas da cidade de Nova Iorque. Basta registrar-se no site do evento;
Você pode conferir o diretório de cooperativas de plataformas no site do Platform Coop.
O Laboratório DigiLabour lançará em breve o Observatório do Cooperativismo de Plataforma, com financiamento da Fundação Rosa Luxemburgo. Detalhes nas próximas edições da newsletter